DESSALINIZADOR DE ÁGUA POTÁVEL

          Paul lhe disse que as coisas iriam mudar. 
          – Como irão mudar, querido? – inquiriu a esposa.
          – Irão mudar sim, você verá.
          – Ora, Paul! Gogó de político não tem. Voz afinada piorou. Apreciável estética física de ator? Meu Deus! Jogador de futebol? Só em outra encarnação. Então, acho melhor aquietar entusiasmos e ir acostumando−se com a ideia de continuar como auxiliar de faxineiro.
          – As coisas irão mudar. – afirmou.
          – Meu Deus!
          Paul dedicou−se a pesquisas e, uma semana depois, entusiasmado, lhe dizia:
          – Sílvia, amada e querida esposa, a internet é, sem dúvida, uma fantástica ferramenta de pesquisas. Estou abismado com o tanto que aprendi.
          – Que ótimo, Paul!
          Sílvia, passando a pentear os cabelos, perguntou−lhe onde queria chegar com aquela conversa.
          – Ao mais nobre dos dons, amor.
          – E que dom seria esse, Paul?
          – Inteligência, divina querida, a qual você, em uma nossa não distante conversa, a subestimou.
          – Diz a mim que detém este dom, Paul?
          – Sim, princesa.
          – Flanela elétrica, que pretende inventar, tesouro?! – ironizou.
          Nada. Respondendo−lhe, mostrou−lhe uma caixa de sapatos, forrada, estando à vista uma torneira.
          – O que é isso Paul?! – quis saber ela.
          – Protótipo do meu invento, querida! Acabo de inventar um dessalinizador de água potável.
          – Como é?! Dessalinizador de água potável?!
          – Perfeitamente, amor.
          – Invento ou picaretagem, Paul?
          – Particularidades à parte, não é, benzinho?
          Paul, apostando em sua inteligência, desfez−se de uma pequena propriedade. Investiu parte do montante recebido na industrialização daquilo, e o restante reservou para investir em propaganda. Exaltava ele, dois meses depois:
          – Sílvia, amada e querida esposa. Certo está quem diz ser a propagada a alma do negócio. Cinco. Apenas cinco tímidos outdoors espalhados pela cidade: “DESSALINIZADOR DE ÁGUA POTÁVEL IMPERIAL. O REGULADOR NATURAL DA PRESSÃO ARTERIAL!”. Já está me causando boas expectativas de aceitação. O telefone hoje à tarde não parou de tocar.
          No entanto, ela, após olhá−lo atentamente, disse−lhe que estava achando o marido tristonho.
          – Percebe, amor?
          – Claro que sim, querido. O que está havendo?
          – Números, Sílvia. Números. Depois de todo trabalho e dedicação, a minha ponta permanente mensal será de apenas um por cento. A genética do produto implica nisso, querida: gastos com negociações, divulgações e propagandas.
          – No entanto, esse um por cento equivalerá a quantos salários de auxiliar de faxineiro, Paul?
          – A inúmeros, amor.
          – Então compensará, querido. Espante−se e conforme−se, pois é invento típico de que jamais poderá ter os lucros sem dividi-los com outros espertos.
          A empresa se expandiu. Certa revista, que havia ficado fora da partilha de publicidade, publicou vasta matéria, detonando o dessalinizador de água potável imperial. Entretanto, Paul, bem orientado que estava, não deu importância. Meses depois, exportava e, pelo visto, condecorações não haveriam de lhe faltar.


ILUSÃO OU FATO?