"Ponha na cabeça, amigo, que não é você a pessoa má, mas a posição a qual, 'aos trancos e barrancos', conseguiu conquistar. Visitem o Templo da Verdade. Foi nele que consegui encontrar a paz."
O TEMPLO DA VERDADE $
As instalações do Templo da Verdade eram modestas. Em pontos estratégicos está escrito em letras garrafais: $ A VERDADE VOS LIBERTARÁ!
Valício e a esposa, seguindo o conselho do amigo, ali se encontraram. Observando em volta, cochichou Oninha:
– O culto vai começar.
A fundadora do Templo, Nigre, 36 anos, surgindo por completo no altar, repetiu a considerada e habitual saudação:
– Que o dinheiro esteja convosco, meus queridos irmãos e irmãs.
– E contigo também. – responderam os fiéis presentes.
Valício e a esposa, mudos, se olharam. Nigre então disse:
– Que gratificante não é verdade? Que o dinheiro esteja convosco e comigo também! Ora, meus queridos irmãos e irmãs, será que existe na face da terra algo mais maravilhoso do que o dinheiro? Evidente que não. E creiam, a célula do bem−estar é tão antiga quanto a existência da Humanidade. Pois, lá atrás, já havia um referencial que determinava poder, e quanto mais referencial o indivíduo tivesse mais poder tinha. No entanto, meus queridos irmãos e irmãs, falar de status, dinheiro e poder, sem que no contexto esteja inserido o aproveitamento de circunstância, de esperteza e de desonestidade, seria faltar com a verdade, não é mesmo? É bem verdade que existem casos de glória dentro dos limites da honestidade. Entretanto, é um grão de areia no universo…
– …
– Digo-lhes, meus queridos irmãos e irmãs, que a procura pelo nosso Templo está crescente. A razão disso é a história que venho contando sobre a sua criação. Ora, éramos médios industriais e tínhamos falido. O amor que havia em nossa pequena família começou a se escapar pela janela. Os parentes sumiram, os amigos desapareceram e os vizinhos mudaram de passeio. A nossa guria de quinze anos de idade se fechou igual a bicho, e os costumeiros pedintes nos viraram a cara. Tínhamos então que sair daquela situação de desprezo. Assim, num certo dia, pensamentos assentados num patamar perfeito, perguntei ao meu esposo se o irmão dele nos alugaria este salão, onde estamos agora, e que se encontrava vago. Indagando, a título de quê, disse−lhe que seria para instalar um templo. Um templo?! Questionou ele. Só se no topo da torre houvesse ostentado o cifrão como símbolo! Adivinhava o meu pensamento. Perguntou−me se pregaria para que não amassem o dinheiro. Neguei. Disse−lhe que pregaria para que assumissem, destemidos, o amor pelo dinheiro, pois a verdade os libertaria. Disse−lhe, também, que seria uma doutrina superior às demais, pois não haveria hipocrisia nem falsidade, já que o amor pelo dinheiro, o bem maior da vida, estaria escancaradamente declarado. Perguntando−me ainda qual seria o método de arrecadação, pois todas as seitas possuíam o seu, disse−lhe que visualizava um cofre, de relativo tamanho, no formato de um porco. No decorrer das palestras passaria o cofre ao lado das cadeiras com o seguinte incentivo clamado por mim: “Vamos nos alimentar, meus queridos irmãos e irmãs, vamos dar alma ao porco!” Ora, achando ele a ideia, por demais arisca, repliquei: por favor, Narato! Pregarei para pessoas cínicas, desonestas e safadas. Aposto que irão gostar… – houve risos e aplausos.
A esposa e Valício se olharam e, após meditarem, aplaudiram também.
– Meus queridos irmãos e irmãs, a verdade vos libertará!
– Que assim seja! – replicaram.
Continuando sua fala, Nigre disse:
– A verdade vos libertará, meus queridos irmãos e irmãs. Até porque, “quem não nos conhece, que nos compre”.
– …?! – Valício e a esposa.
Um auxiliar invadiu o recinto empurrando o cofre.
– … Vamos nos alimentar, meus queridos irmãos e irmãs, vamos dar alma ao porco! – dizia ela.
O casal, convencidos de alguma verdade, abriram as suas carteiras e, com expressivas cédulas em mãos, aguardavam a passagem do objeto.
– Vamos nos alimentar, meus queridos irmãos e irmãs, vamos dar alma ao porco! – repetia ela olhando os valores das cédulas que estavam sendo introduzidas no cofre.
Havia satisfação nos depósitos.
– Vamos nos alimentar, meus queridos irmãos e irmãs, vamos dar alma ao porco!