RESTA SABER

Quando o amigo partiu e a porta se fechou, o que restou na sala foram olhares contrariados direcionados para a arma que descansava sobre a banqueta de centro.


 
          – Pedido inconveniente. Viajaremos com uma arma que não nos pertence e retornaremos com outra que também não nos pertence. Temos arma, mas evitamos usá-la. – resmunga Carla. 
          – Não tive como negar, querida. Você muito bem sabe o motivo, portanto não me olhe assim. Por falar em arma, ouviu o que Hermano disse? – conversa Junqueira.
          Tipos estranhos estavam tirando o sossego do pacato município.
          A arma, que ainda permanecia sobre a banqueta, era para ser entregue ao amigo do solicitante o qual, em uma conversa sobre armas, se braguearam, ficou com a arma do amigo e esse ficou com a arma dele. Como o casal solicitado ia passar o final de semana no sítio localizado no município desse amigo, pouparia que um deles percorresse duzentos e vinte quilômetros desnecessariamente. Assim frisou o solicitante
          Às 21 horas, o casal se prepara para viajar. Chegaria ao sítio por volta das 1:30 horas, dormiria e, nas primeiras horas do raiar do dia, praticaria a paixão: cuidar da horta dos canteiros de flores e dos pequenos animais.
          O dia já tinha nascido e eles já tinham despertado e cuidado dos afazeres que gostavam. Por volta das 9:00 horas, sentados à mesa deliciando-se com o dejejum e conversando sobre o rápido desenvolvimento das rosas, o queijo não é cortado, pois foram surpreendidos com três estranhos elementos no interior da sala.
          – As chaves do automóvel. – pede um deles.
          Sobre a peça mobiliária, estavam aparelhos celulares, relógios, carteiras e as chaves do automóvel. Apontados, o malfeitor vasculha as carteiras... Escutam movimentação no portão. Da sala se avistava o automóvel na comprida garagem e o portão adiante onde a movimentação acontecia. Um dos intrusos vai verificar o que acontecia. Ao retornar, informa que o pneu da lotação havia furado justamente no portão. O líder do bando pronuncia que aguardariam o reparo. Levaria o automóvel como havia dito.
          – Enquanto a troca do pneu não acontece, sentaremos à mesa e tomaremos café como se fosse uma grande família. – disse ele.
          Caso o casal quisesse protagonizar uma cena chamativa de atenção. Os meliantes estariam em apuros, porém as consequências seriam imprevisíveis. Não empunhavam armas, mas estavam armados.
          Junqueira menciona se erguer.
          – Para onde vai?
          – Providenciar xícaras.
          – Não somos idiotas. A gostosona que providenciará e nos servirá.
          Alguém exigia a presença de algum representante da residência no portão.
          – Quem vai atender? – pergunta Junqueira.
          Um dos bandidos se prontifica. Ao retornar, vem na companhia de uma senhora e de uma garota. A menina desejava usar o banheiro. Carla diz que a levaria. Ausentando-se, a senhora olha para os quatro homens e pergunta se alguém havia morrido.
          – Não que eu saiba. – responde Junqueira.
          – Estão com umas caras...
          –… Vendi o carro para eles, mas estão empatados de saírem. – retruca Junqueira pensativo.
          – A troca do pneu logo finalizara. – diz a senhora.
          Carla reaparece com a garota e, ao devolvê-la, a mulher pede maliciosa para que sentem à mesa para tomarem café.
          – Agradecida, mas já tomamos. – responde a senhora.
          – Eu posso? – pergunta a menina.
          – Claro que pode. Sente-se. – consente Carla.
          Os bandidos se olham. Carla ausenta-se. Reaparecendo com uma bandeja contendo xícaras pires e colher. Arruma a mesa e convida todos a sentarem. A senhora que havia rejeitado o convite também se senta. Carla senta-se ao lado do esposo e diz:
          – Café regrado porque não contávamos com o imprevisto, mas pão, leite, queijo… presunto e bolo há à vontade, sirvam-se.
          Entretendo-se com a comida, Carla passa discretamente por debaixo da mesa a rejeitada arma para o esposo.
          – Tudo gostoso! – elogia a menina.
          Minutos depois, a troca do pneu estava concluída. O motorista buzina. A senhora e a garota agradecem e se despendem. Os bandidos aguardam a condução partir. Um deles olha para o casal refém e pergunta ao chefe:
          – Eles nos acompanharão?
          – Amarraremos no banheiro. – responde o chefe.
          – Seria divertido se ela fosse conosco.
          –…
          A lotação parte… Como num filme, Junqueira se ergue e dispara. Foram três disparos com endereços distintos. Tombam sobre a mesa.
          – Porcos! Imundos! – grita Junqueira.
          Carla recupera os aparelhos celulares.
          – Ligue para Hermano. – ordena Junqueira.
 
 
ILUSÃO OU FATO?