BALÕES COLORIDOS

 Manhã do primeiro domingo do mês de outubro de 1970. Libertados por jovens estudantes, colegas da vítima, balões coloridos subiam ao céu...



         
 A cidade de Giro Luz estava de luto. Sepultava no Memorial Batalha Infernal Rosanna Kimberly, 17 anos, a quarta vítima de um possível assassino em série. Outrossim, Kael Douglas, 36 anos, agente federal designado para apurar o caso, fumando ao volante do Ford preto ano 62, observava à distância o concorrido evento. O quadro de polícia da Cidade de Giro Luz, não dispunha de investigador.

Segunda–feira posterior ao mencionado domingo:

          A tradicional animosidade existente entre as polícias federal e local inflava. O magoado Xerife Alan Foyd 63, fulo da vida, chapéu sobre a mesa e pernas descansando em sua superfície, observava a movimentação do ‘intruso’ no seu escritório. Kael Douglas havia analisado as fotos e lia os depoimentos dos pais das vítimas. Disse então o magoado Xerife:
          – Pergunto à majestade se observou os balões coloridos subindo ao céu? Se observou, nada enxergou.
          – ...
          – Ao tentar colocar você a par da situação, vaidoso, pediu–me para que economizasse palavras porque era agente federal cursado na academia de polícia. Portanto, sabia como conduzir uma investigação. Assim sendo, para não irritar a majestade, limitei–me a informar que os depoimentos dos pais das vítimas eram curiosamente idênticos. As filhas menores de idade pareciam guardar segredo que iam além de uma noite de sexo ou de uma rodada de haxixe.
          Kael Douglas ergueu as vistas, o olhou e perguntou onde pretendia chegar.
          – Os nossos distintivos, o meu no peito e o seu omisso no bolso do paletó, não são tão desinibidos assim. Ou seja, machos para os fracos e maricas para os fortes. Isso porque as nossas ações “antipáticas” não sobem degraus: limitam–se ao patamar ou desce. De certo que há momentos de euforia. Mas, quando a fera é encarada, o rabo é recolhido entre as pernas. As fotos que você acabou de visualizar, passando–as como se fossem cartas de baralho, foram encontradas sobre os corpos das vítimas Florine Chera, Helga Portman, Frieda Diaz e Rosanna Kimberly. Pelo velho conhecido caçador de pequenos animais de habito noturno, Jone Jones, de oitenta e cinco anos de idade. Durante as matinais, recuperação das armadilhas armadas no final de tarde do dia anterior. Estamos, portanto, na mata a cinco quilômetros daqui onde os corpos eram abandonados. Tenho sessenta e três anos de idade e quarenta anos de polícia. Ingressei-me jovem, cheio de vigor. Com o distintivo no peito, imaginava até que tinha superpoderes. No entanto, restam–me agora alguns anos de vida e nada mais. Não pretendo que a minha amada esposa e eu passemos os dias que nos restam bebendo água e espalitando os dentes: desprotegidos da aposentadoria, se quer saber. Tinha boa intenção. Aguardava ansioso pela vinda de um de vocês. Armaríamos a arapuca e ficaríamos na espreita. Sairíamos ilesos bem como com os nossos distintivos reluzindo. Mas você esnobou: seja breve, velho. Eu sou “fodão”... No entanto, eu o ajudarei, revelando que, sobre o corpo das vítimas, eram deixadas quatro fotos: as que você folheou. Com o corpo de Rosanna Kimberly, recente última vítima, não foi diferente, no entanto, havia uma quinta foto aderida em uma das demais. Apartadas por Jone Jones e a mim sido confiado. Estou convencido de que as garotas perversas se descuidaram em algum momento do espelho. Também espiei a cerimônia de sepultamento. Tranquilas, libertavam balões como se fossem anjos angelicais.
          O agente federal se mostrou interessado pela conversa e pediu para que continuasse. O Xerife abriu a gaveta da mesa, retirou a foto e a entregou.
          – A quinta foto. – disse.
          – ...
          – Viera aderida às quatro demais, sobre o corpo de Rosanna Kimberly. O lençol não protegia o espelho como nas demais fotos. Assim, reflete quatorze jovens garotas exibindo facas e, no chão, o corpo de Rosanna Kimberly desfigurado numa poça de sangue. Qual seria a finalidade dessa foto, não se sabe. Talvez até para recordação. O certo é que o descuido viera no bojo da insanidade. Porém, o dilema é outro. As duas garotas de cabelos longos, vistas em pose, a la Bonnie e Clyde, são as irmãs Alna e Alba Baylor, filhas de Thomas e Aurelia Baylor. Tradicional família de Giro Luz. Exercem forte influência na politica e no mundo dos negócios, nacionalmente falando. Receio inclusive de que se tiverem o nome manchado, a boa Giro Luz ruirá. Poderia livrá–las do constrangimento e convocar qualquer uma das demais garotas. No entanto, se assim o fizesse a expressiva imprensa local, grudaria na porta da delegacia, e assim o fedido leque teria de ser aberto. Todavia, como se pode observar sobre a minha mesa, há um telefone que o disponibilizo para que contate com os superiores também “fodões”. Deverá orientá-lo de como deverá proceder... Faça como achar melhor. Espero que o telefone toque num patamar seguro. Caso contrário, a nossa fofoca custará caro. Você cheirando fundilhos e eu espalitando os dentes.
          Kael Douglas, pensativo, voltou a olhar para a foto…
          As fotos foram enviadas ao laboratório, cuja autenticidade foi confirmada. No dia do interrogatório coletivo das maquiavélicas garotas, Giro Luz estremeceu. Mais de vinte e cinco mil pessoas concentraram–se na porta da delegacia. Submersas num vazio de argumentos que explicasse o inexplicável, e afirmando que o grupo tinha vinte e oito membros do sexo feminino sob liderança rotativa. Dezoito meses depois, no mês de abril de 1972, restrito às que apareciam na foto delatora. As quatorze jovens foram julgadas e condenadas a vinte anos de prisão, responsáveis pelos assassinatos de natureza fútil e caráter torpe das colegas Florine Chera, Helga Portman, Frieda Diaz e Rosanna Kimberly. O Xerife seguiu no aguardo da aposentadoria e Kael Douglas, formado em Direito, se desligou do emprego federal, reabraçou a carreira, e foi viver num longínquo estado, exercendo o ofício que havia ‘desabraçado’.

 
 
ILUSÃO OU FATO?