VÍTIMAS DAS DROGAS

          Glauco, 34 anos, desenhista projetista, havia aberto todas as janelas do apartamento. No entanto, o cheiro forte persistia. No gabinete de trabalho, ao telefone, ignorando o fato, tentava assimilar o que a secretária da Inol havia lhe informado: que o cobiçado contrato estava desfeito e que se esquecesse do trabalho que estava em andamento.
          – Foi a ordem que recebi, senhor!
          Colocou o fone no gancho. Ao acender o cigarro, o telefone da sala tocou. Dirigiu-se para atender. Apossando-se do aparelho, escutou seu advogado perguntar, nada amistoso, quem lhe havia autorizado adentrar o imóvel. Nas nuvens, respondeu que a Inol havia rescindido o seu contrato.
          – A minha palavra, senhor Glauco, também pesou para o relaxamento de sua prisão. Lembre-se do que o senhor nos prometeu. O imóvel não está liberado.
          Lerdo, acreditou ter escutado o habitual convite de Eliane.
          – A Eliane está me chamando, doutor!
          – Procure me escutar, senhor Glauco, deixe o imóvel.
          – ... A Eliane insiste em me chamar...
          – Deixe o imóvel, rapaz!
          – ... A Eliane me ama.
          – Eu sei. Deixe imediatamente o imóvel. Procure nos ajudar.
          As convidativas palavras proferidas por Eliane repetiram-se: “Glauco? Venha me ver. Encontro-me no quarto.”
          – Vou atendê-la, doutor.
          – Glauco?
          Em vão. Desligou o aparelho. Ao cruzar o corredor, dirigindo-se ao quarto onde acreditava que Eliane se encontrasse, as suas narinas detectaram o ponto que identificava a origem do forte odor. Empurrando a porta da cozinha, ponto de origem do forte desprendimento, deparou-se com o sinistro horror adormecido... Cenário macabro. Típico de filme de terror. Sangue tingia toda a cozinha. Carne humana também deveria haver. Não havia nada, absolutamente nada, no devido lugar. A geladeira, talvez, responsável maior pelo forte odor que impregnava todo o apartamento, continuava tombada no chão... Lembranças começaram a sucumbir. Correu os olhos ao longo do piso. Ao avistar um traçado de fitas, dirigiu-se a ele, verificando, ao se aproximar, que se tratava de um trabalho, não artístico, realizado pela polícia técnica. Sinalizava que ali havia um corpo tombado, sem vida. Agachou-se, ficando a meditar.
          – ... Eliane... – balbuciou.
          Erguendo-se, enxugou os olhos com os punhos. Correu os dedos por entre os cabelos, ascendeu o cigarro e vagou por toda a cozinha. À pia, pensativo, apagou o cigarro no pires, abriu a gaveta do armário, apoderou-se de uma faca encravou-a no peito.
          Vizinhos consternados, presenciavam o corpo deixar o apartamento 518. Uma senhora disse que, há exatos oito dias, o corpo de Eliane passava completamente embrulhado. Praguejou. Daquela vez não haveria habeas-corpus para livrá-lo daquela condição. Entretanto, era um bom rapaz, perdeu-se no mundo das drogas. A doce Eliane, que Deus a tivesse, o implorava, todo santo dia, para que abandonasse o vício. Coisa que o vício não permitiu.

 
 
ILUSÃO OU FATO?